A palavra
consciência, de acordo com o dicionário Michaelis é a capacidade que o homem
tem de conhecer valores e mandamentos morais e aplicá-los nas diferentes
situações. Mas, afinal o que é consciência? e quais são os tipos de
conhecimento que o ser humano pode desenvolver?
Desde que passamos a questionarmo-nos acerca do mundo e do que
presenciamos nele, a ciência, em especial a filosofia, estudam e tentam
compreender a ação da consciência sobre nosso corpo e mente. Esse esforço
reuniu as ciências, como psicologia, antropologia, sociologia e
neuropsicologia, para uma sistematização teórica do tema.
A filosofia, ao investigar a realidade através da construção de
conhecimento mais autêntico, faz isso por uma dimensão que podemos chamar de
consciência. Por esta consciência nós formamos nossa visão de mundo, sociedade
e de nós mesmos. A consciência abrange a dimensão da mente humana (individual)
mas não só do individuo isolado, mas também do social (consciência coletiva).
Comumente somos levados a relacionar a consciência apenas como a capacidade
de compreender de maneira racional uma dada realidade. Porém, com o
desenvolvimento do homem ao longo do tempo, foi-se distinguindo diferentes
formas de consciência que predominaram durante a história da humanidade. De
maneira geral, podemos identificar três tipos de consciência que se
estabeleceram na relação do homem com o mundo: a mítica, a religiosa e a
racional (TOMELIN; SIEGEL, 2013).
A consciência crítica, que também pode ser uma atitude crítica tem um
olhar negativo e outro positivo. Negativo quando se afirma contra ou se opõe ao
preconceito e aos valores engessados da sociedade. Positivo quando
questiona e interroga o motivo das coisas (CHAUI, 1997, p. 12)
Consciência mítica,
religiosa e racional
A palavra racional vem do latim ratio
e do grego logos e seu
significado se estende aos verbos calcular, separar, contar, medir. A expressão
pressupõe que conhecimento se orienta por um método e uma ordem (TOMELIN;
SIEGEL, 2013). Essa concepção em grande parte foi construída pela filosofia. Mas,
foi a ciência que mais se apropriou da condição de razão e deu sua assinatura
ao fato com o termo racionalidade
científica.
A racionalidade científica pondera conceitos, como método experimental,
universalidade do conhecimento, formulação de teorias, enquanto a racionalidade
filosófica está voltada para questões humanas que não podem ser verificadas por
leis universais ou experimentais (CHAUI, 1997).
A consciência religiosa afirma-se na construção argumentativa partindo
da revelação divina. A doutrina religiosa é considerada infalível e
indiscutível, parte de uma aceitação convicta de que suas verdades são
absolutas. Este tipo de consciência dispensa os indivíduos da atitude reflexiva
e transformadora diante do mundo, sendo uma visão estável e conformista da
realidade. (ARANHA; MARTINS, 1999).
A consciência mítica, se assemelha à religiosa, tem na mitologia a base
para explicar as condições naturais e sociais de nossa realidade. O mito pode
oferecer explicações sobre a origem do universo e da Terra, mas elas são
baseadas na crença e dificilmente são verificáveis pelas evidências. É baseada
na tradição oral do compartilhamento do conhecimento.
Consciência crítica e
educação
Ao tomar consciência do mundo, cada pessoa se responsabiliza por seus
atos e por isso deve respeitar todas as dimensões que demandam dos indivíduos
de uma sociedade.
Ao analisarmos o mundo por uma perspectiva crítica nós identificamos as
contradições na sociedade, isso nos impõe uma situação difícil, mas inevitável
ao pensador crítico. Restam dois caminhos: optar pela humanização ou negá-la.
Para o filósofo brasileiro Paulo Freire é fundamental que a educação não
fique indiferente diante das mazelas da humanidade. A educação deve demonstrar
que os problemas não surgiram por mágica e, sim, por condições históricas
elaboradas por pessoas reais. E se são reais, podem ser responsabilizadas por
isso. A própria educação é vítima desse tipo de desarranjo (KEIM, 2011; FREIRE,
2002).
O fato desse desarranjo educacional é o fato de que como Marx afirma: “Os
homens fazem a História, mas não sabem que a fazem”. O que nos põe diante da
seguinte situação, segundo a filósofa Marilena Chauí:
Podemos chamar isso de alienação social, sendo que essa questão pauta-se no desconhecimento das condições histórico-sociais concretas em que vivemos, produzidas pela ação humana também sob o peso de outras condições históricas anteriormente determinadas. Há uma dupla alienação: por um lado, os homens não se reconhecem como agentes da vida social com suas instituições, mas, por outro lado e ao mesmo tempo, julgam-se indivíduos livres, capazes de mudar suas vidas individuais como e quando quiserem, apesar das instituições sociais e das condições históricas. No primeiro caso, não percebem que instituem a sociedade; no segundo caso, ignoram que a sociedade instituída determina seus pensamentos e ações (CHAUI, 1997, p. 72).
Voltando a Freire (1996), a educação tem importância na formação da
consciência crítica. É por meio de ambas que as pessoas construirão sua
criticidade, fato que possibilita aos indivíduos serem autores de sua própria
história e não apenas espectadores de sua vida.
Tipos de conhecimento
Existem diferentes formas ou tipos de conhecer a realidade física ou social de nosso mundo, entre eles: mitológico, senso comum, científico, filosófico, artístico e religioso.
O conhecimento mítico ou religioso são constituídos de saberes sobre a existência humana, como a morte, o espírito, o sentido de existir, a fé e as questões espirituais. Denotando um aspecto de magia que não depende de explicações racionais, resumindo-se em verdades absolutas e dogmáticas.
Versando entre as primeiras compreensões do mundo, pelo indivíduo, é chamado de senso comum, o qual é adquirido por herança do grupo social em que estamos inseridos e se forma pelas vivências do cotidiano. É originário da tradição oral e dos saberes espontâneos, é um conhecimento superficial e fragmentado.
Chegamos então ao conhecimento científico, que por conjunção de fatores históricos que confirmaram sua eficácia ele é considerado determinante e superior sobre outras formas de conhecimento. Seu principal objetivo é a explicação dos fenômenos físicos ou sociais mediante um método que seja racional, verificável e experimental. O principal anseio que mantém a condição humana ao conhecimento científico é sua aplicabilidade e funcionalidade facilmente perceptível e a coerência que o mesmo apresenta, além de nos proporcionar um controle da realidade.
No entanto, o saber científico não pode desconectar suas ações e consequências da dimensão da ética, o ethos da ciência; e desconsiderar que não é possível alcançar uma verdade absoluta. Num processo contínuo de auto-correção.
O conhecimento artístico não tem a pretensão de ser objetivo, prático nem tampouco exato. O anseio do mesmo é a interpretação e ampliação da sensibilidade diante da complexidade da realidade da estética. Tendo sua maior base na subjetividade do indivíduo e de quem interpreta a obra ou a realidade.
Os saberes podem somas diversidades, assim a realidade terá em seu horizonte a ampliação da ética, da humanização e da valorização da vida. Entretanto, temos que ter padrões claros de absorção de conhecimento, dentre os apresentados o conhecimento científico apresenta-se como o mais apto e legitimado a ser o norteador sobre o entendimento da natureza e da vida social.
Conhecimento, tecnologia e educação
A tecnologia não tem uma origem muito clara. Desde a pré-história, o ser humano construiu ferramentas para enfrentar os desafios da natureza e garantir a sobrevivência. Entretanto, foi após a Revolução Industrial que o conhecimento científico passou a se aliar à produção de artefatos e sistemas tecnológicos, o que transformou, como nunca visto antes, a relação entre os indivíduos e destes com o mundo.
Após isso, claramente observamos que a mesma tecnologia que pode ser utilizada para o bem comum da humanidade, pode ser utilizada para a destruição da mesma, como as tecnologias utilizadas para a guerra. Após as bombas atômicas lançadas em Hiroshima e Nagazaki, aumentou-se a preocupação com o éthos da ciência. (ver MERTON, 1937).
O presente e futuro oferecem-nos sérios motivos de preocupação: poluição, crise ambiental e das fontes de energia, escassez de água potável, doenças, desigualdade socioeconômicas, terrorismos e totalitarismos. São consequências de uma força gananciosa por progresso ilimitado e acúmulo de riquezas. Se por um lado a sociedade do consumo proporciona facilidades domésticas, revoluções médicas e estéticas, um bem estar nunca visto na história, por outro, qual é o preço a ser pago por este modelo?
Esta perspectiva apresenta-nos um questionamento sobre os problemas em que a forma de produzir tecnologia podem ser proporcionar para o nosso lar planetário e a nós mesmos. O que nos indica uma crescente preocupação e revisão da ética da ciência.
É observável que o avanço do desenvolvimento técnico e tecnológico não confirmou o desenvolvimento de uma sociedade mais humana e justa. Para os otimistas, a humanidade se direciona para o bem-estar social cujo trabalho, através das máquinas, não será mais degradante. Para os pessimistas, a sociedade será vitimada pelo excesso de controle, pela perda da privacidade e pelo alto custo social dos bens tecnológicos de consumo (TOMELIN; SIEGEL, 2013; CUPANI, 2011; DUPAS, 2006).
A crítica aqui apresentada não é quanto a legitimidade da ciência e seu campo conceitual, teórico e metodológico, mas sim à utilização e formas de uso da mesma. Como Freire nos lembra: ou optamos pela humanização ou a negamos. Também podemos ver isso nas abordagens de Carl Sagan no Pálido Ponto Azul.
Referências:
ARANHA, M. L de A; MARTINS, M. H. P. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1999.
CHAUI, M. Convite à filosofia.
São Paulo: Ática, 1997.
CUPANI, A. A filosofia da tecnologia: um convite. Florianópolis: UFSC, 2011.
DUPAS, G. O mito do progresso: ou progresso como ideologia. São Paulo: Unesp, 2006.
FREIRE, P. Pedagogia
do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
KEIM, E, J. Paulo Freire e a
complexidade na educação. Dialogia -
Revista do Departamento de Educação - Centro Universitário Nove de Julho,
UNINOVE, v. 0. p, 32-40, 2001.
MORELL, J. C. Pensamentos Pedagógicos e Sistemas Educacionais.
Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2014.
TOMELIN, J. F.; SIEGEL, N. Filosofia geral
e da educação. Caderno de estudos. Indaial: Uniasselvi, 2013.